Tratamento de Asma em Pediatria

Autoras: Maria Helena Valente e Filumena Maria da Silva Gomes

Tratamento:

 

• No acompanhamento em todas as consultas, pergunta-se e orienta-se sobre:
– Controle ambiental.
– Redução de carga alergênica de ácaros.
– Aeração e ventilação.
– Capas nos travesseiros e colchões.
– Retirada de animais de pelo do domicílio.
– Não exposição a odores fortes.
– Controle do mofo doméstico.
– Evitar tabagismo ativo e passivo.
– Técnica e adesão ao tratamento caso já use alguma medicação diariamente.
– Realização de atividade física.

• Avaliação e tratamento de comorbidades, como obesidade, rinite, doença do refluxo gastroesofágico (DRGE), ansiedade etc.

• De acordo com a classificação na consulta atual, definir as etapas do tratamento.

• Fazer reavaliação a cada 2-3 meses.

• O objetivo deve ser a utilização da menor dose medicamentosa efetiva possível para o controle dos quadros.

 

Medicamentos utilizados no tratamento

 

SABA (beta-2-agonista de curta duração inalado):

• Broncodilatadores de curta duração para alívio de sintomas. Agem por 4-6 horas.
• Exemplo: salbutamol.
• Corticosteroide inalatório.
• Drogas mais eficazes para controle da asma persistente de qualquer grau.
• Efetivo efeito anti-inflamatório.
• Pode ser usado como monoterapia.
• Efeito colateral: podem ocorrer candidíase oral (orientar enxaguar a boca após seu uso) e rouquidão.
• A adesão ao tratamento diário é parte crucial do tratamento.
• Uso precoce do tratamento com CSI apresenta ganho importante de função pulmonar.
• Educação, verificação e demonstração da técnica inalatória correta em todo atendimento.
• Exemplos:
– Dipropionato de beclometasona.
– Budesonida.
– Propionato de fluticasona.
– Ciclesonida.

 

LABA (beta-2-agonista de longa duração):

• Ação mantida por mais de 12 horas.
• Evitar uso em monoterapia.
• Exemplos:
– Salmeterol (início de ação em 30 minutos).
– Formoterol (início de ação rápida, em minutos).

 

Associações CSI+LABA:

• Nomes comerciais:
– Formoterol + budesonida: Alenia®, Vannair®, Symbicort®.
– Formoterol + beclometasona: Fostair®.
– Salmeterol + fluticasona: Seretide® spray e Diskus.

 

LTRA (antagonistas de receptores de antileucotrienos):

• Montelucaste: eficaz no controle dos sintomas e melhora da função pulmonar na asma persistente leve e moderada.
• Altamente eficaz em comparação com CSI em dose baixa.
• Grande variação individual, em que um subgrupo apresenta excelente resposta. No entanto, a identificação prévia, antes do uso da medicação do subgrupo, não é possível.
• Via oral a partir dos 6 meses de vida.
• Dosagem: acima de 6 meses de idade dose 4 mg/dia; escolares a partir de 6 anos, dar 5 mg/dia; e adolescentes maiores de 15 anos, dar 10 mg/dia.

 

Tiotrópio:

• Anticolinérgico de longa duração.
• Inalador de névoa suave, para maiores de 6 anos.
Anti-IgE
• Omalizumabe, por via subcutânea, em maiores de 6 anos:
• Anticorpo monoclonal humanizado anti-IgE.
• Uso restrito em casos de asma alérgica em adolescentes e adultos que não se beneficiaram com outros tratamentos.
Anti-IL-5
• Mepolizumabe, por via subcutânea, em maiores de 12 anos.
• Reslizumabe, por via intravenosa, em maiores de 18 anos:
• Anticorpo monoclonal humanizado que atua contra a interleucina-5.
• Quando já não se beneficiou do anti-IgE.
Escolha dos dispositivos
• Depende da faixa etária:
• 0-3 anos: spray + espaçador com máscara facial.
• 4-5 anos: spray + espaçador com peça bucal.
• 5 anos: inaladores de pó ou spray com espaçador e peça bucal.

 

Tratamento medicamentoso da exacerbação da asma

 

Beta-2-agonistas de curta duração – broncodilatadores (SABA):

• Salbutamol/fenoterol/terbutalina.
• Relaxamento da musculatura brônquica.
• Preferencialmente inalatória.
• Iniciar o mais rápido possível.
• Dose inicial: de 2 a 4 jatos (200 a 400 mcg) com espaçador.
• A cada 20 minutos na primeira hora.
• Crises mais graves: de 4 a 10 jatos a cada 20 minutos:
• Após primeira hora, o intervalo é individualizado.
• Somente beta-2-agonistas de curta duração são suficientes? Caso não sejam suficientes, podem-se usar:
– Brometo de ipratrópio em associação aos beta-2-agonistas de curta duração que amplificam a resposta broncodilatadora, ou
– Corticoides sistêmicos/inalatórios pela ação anti-inflamatória. Uso deve ser precoce, em paralelo aos beta-2-agonistas de curta duração. Preferencialmente por via oral. Prednisona ou prednisolona/metilprednisolona ou hidrocortisona.
– Oxigenoterapia.

 

Tratamento medicamentoso de manutenção da asma

 

Nos pacientes com idade ≤ 5 anos, indicar tratamento de controle quando:

• Padrão de sintomas sugere asma com episódios frequentes (três ou mais) ou episódios menos frequentes, porém graves, de sibilância induzida por vírus.
• Diagnóstico de asma é pouco provável, mas uso de broncodilatador de curta ação é frequente (cada 6 a 8 semanas ou mais).
• Individualizar o tratamento.
• O tratamento da asma considera as terapêuticas mais adequadas segundo as características fenotípicas e mesmo genotípicas, como:
• Em crianças com asma leve, a comparação do uso de CSI em dose baixa versus antagonista de leucotrienos mostrou que pacientes com função pulmonar alterada ou altos níveis de marcadores da inflamação alérgicas devem ser tratadas com corticoides. Na ausência dessas características, pode-se usar qualquer uma dessas opções terapêuticas e aguardar a resposta delas.
• Asma moderada: beta-2-agonistas de longa duração são utilizados como droga adicional aos CSI.
• Asma não adequadamente controlada com doses baixas de CSI: aumentar a dose de corticoide, adicionar o beta-2-agonista de longa duração ou antagonistas de leucotrieno.
• Uso de beta-2-agonistas de longa duração: liberado apenas para maiores de 4 anos de idade.
• Quando houver coexistência de quadro de rinite alérgica, deve-se tratar com anti-histamínicos de última geração e/ou corticosteroides intranasais.

 

Recomendações para a asma

• Parceria entre equipe médica e família.
• Educação sobre fisiopatologia da asma.
• Reconhecimento de sintomas e gravidade.
• Utilização de drogas de manutenção.
• Manutenção de higiene ambiental.
• Estímulo da criança para vida normal com atividade física e esportes.
• Escolha do dipositivo inalatório mais adequado para a criança.
• Checagem do manuseio do dispositivo inalatório em toda consulta:
• Aerosssol dosimetrado pressurizado com espaçador pode ser utilizado em qualquer idade.
• Dispositivos de pó estão indicados a partir dos 6 anos de idade.

 

Acompanhamento do Portador de Asma:

• Para o controle da asma, é necessária uma avaliação contínua.
• Em cada consulta, deve ser verificado o controle da doença com a conduta adequada, que deve respeitar o escalonamento de dose do CSI e/ou a associação de outros medicamentos.
• CSI em dose baixa são indicados como tratamento inicial da asma persistente para qualquer idade. Quando o controle não foi alcançado, deve-se aumentar a dose do CSI.
• Nos adolescentes, associar CSI e beta-2-agonista de longa duração.
• Quando o controle da asma foi alcançado e mantido por 3 meses: tentar a redução para a dose mínima necessária para controle.
• A maioria das crianças asmáticas tem boa resposta às baixas doses de CSI, sem efeitos colaterais.
• Nas crianças sem boa resposta ao tratamento convencional: verificar a adesão ao tratamento (técnica inalatória, e rechecar o diagnóstico de asma). Investigar comorbidades (rinite alérgica, refluxo gastroesofagico), exposição ao tabaco e alergenos específicos.
• Sensibilização ao pó domestico, hiper-responsividade brônquica, sexo feminino, tabagismo e asma de início precoce são associados a persistência e recaídas.
• Se não for obtido o controle, encaminhar para especialista.

 

Prescrição na Prática:

• Exemplo de prescrição (cada caso deve ser avaliado individualmente e a decisão deve ser tomada pelo médico responsável pelo caso).
• Criança de 7 anos, sexo masculino, apresenta quadro de sibilância de repetição desde os 2 anos de idade, com intervalo atual de 20 dias entre os episódios, com tosse noturna diária e limitação para correr quando vai ao futebol. Tem sensação de “aperto” no tórax quando corre ou sobe escadas. Apresenta coriza hialina frequente e associada aos episódios de tosse.
• Realiza visitas frequentes à emergência por tosse e “falta de ar”, que melhoram com a inalação. Já foi internado duas vezes por esse motivo.
• No dia da consulta, tinha tosse produtiva, “chiado” e discreta “falta de ar”. Secreção nasal hialina, palidez de mucosas nasais.
• Antecedentes familiares: pai com história de asma. Mãe tabagista, presença de cortinas, dois gatos.
• Ao exame físico, apresentava discreta retração de fúrcula esternal, sibilância difusa.
• Hipótese diagnóstica: asma brônquica e rinite alérgica.
• Conduta: nesse momento, foi realizado tratamento para crise com SABA e corticoide oral, com solicitação de retorno em 5 dias.
• No retorno, foi observada melhora das queixas, sem tosse ou “chiado”, e sem limitação de atividade física.
• Ao exame físico: sem secreção nasal, pulmões limpos, sem outras alterações.
• Foi solicitada espirometria, porém o paciente não conseguiu técnica adequada para realização do exame.
• Para início do tratamento profilático, foi prescrito CSI isolado (beclometasona 250 mcg) em aerossol com espaçador a cada 12 horas associado ao corticoide nasal. Orientada a técnica inalatória.
• Após 2 meses, a criança retorna para reavaliação referindo melhora dos sintomas, mas ainda com três episódios de tosse, sibilância e “falta de ar”. Revisada a técnica inalatória. Nesse momento, foi aumentada a dose de CSI.
• Apesar do aumento da dose da beclometasona, a resposta não foi adequada. Revisada a técnica inalatória. Nesse momento, insistiu-se na orientação da não exposição ao tabagismo passivo.
• Foi trocada a beclometasona por CSI associado a LABA (formoterol e budesonida em aerossol) e mantido o corticoide nasal.
• No entanto, houve a persistência do tabagismo domiciliar e, no retorno, após 1 mês, observou-se redução das crises de asma, mas PHA ainda apresentava limitação aos esforços e pouca tosse noturna, com redução das queixas nasais. Nesse momento, foi acrescentado montelucaste ao CSI + LABA.
• Revisada a técnica inalatória, que se encontrava adequada. Nesse momento, apesar da combinação de CSI, LABA e montelucaste, não houve a resposta esperada, apesar de redução dos sintomas, pelo que não se conseguiu a redução das doses das medicações. A mãe persistia com tabagismo domiciliar.
• Com 11 anos, foi solicitada espirometria, que revelou padrão obstrutivo responsivo a SABA. Nessa época, foi solicitada a dosagem de IgE total para possível anti-IgE (omalizumabe).
• Com 12 anos, o adolescente foi morar com a avó, num ambiente sem tabaco, com melhora evidente do quadro, quando foi possível reduzir as doses dos medicamentos.

 

Referências:

Valente MH, Gomes FMS. Asma em pediatria: diagnóstico e tratamento. InforMed, 2022. Disponível em: https://app.informed.digital/conteudo/5e3c9d198f413a3169784b8d.

 

IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma. J Bras Pneumol. 2006;32(Suppl 7):S447-S74.

 

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Muchão FP, Filho LVRFS. Asma aguda. In: Rodrigues JC, Adde FV, Silva Filho LVRF, Nakaie CMA. Doenças respiratórias. 3rd ed. Barueri: Manole; 2019.

 

Pastorino AC, Casagrande RRD. Asma. In: Pastorino AC, Castro APBM, Carneiro-Sampaio M. Alergia e imunologia para o pediatra. 3rd ed. Barueri: Manole; 2018.

 

Silva ECF. Asma: atualização GINA 2019. http://www.asbairj.org.br/src/pdf/Aulas%20e%20V%C3%ADdeos/Asma%20Atualiza%C3%A7%C3%A3o%20GINA%202019.pdf.

 

Vergani KP, Eller MCN, Pitrez PMC, Rodrigues JC. Asma grave em Pediatria. In: Rodrigues JC, Adde FV, Silva Filho LVRF, Nakaie CMA. Doenças respiratórias. 3rd ed. Barueri: Manole; 2019.

 

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