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Febre de origem indeterminada: diagnóstico e tratamento

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Febre de origem indeterminada: diagnóstico e tratamento
Por: Rodrigo Antonio Brandão Neto

Introdução

  • A maioria dos episódios de febre é de curta duração e não requer investigação diagnóstica ou terapia específica.
  • A definição atual de febre de origem indeterminada (FOI) utiliza critério de febre de pelo menos de 1 semana de duração de febre e a realização de uma investigação apropriada.
  • A seguir, a investigação mínima para pacientes com FOI:
    • História e exame físico detalhados.
    • Hemograma completo.
    • Bioquímica sanguínea: enzimas hepáticas, bilirrubinas, função renal, eletrólitos.
    • Se enzimas hepáticas alteradas, solicitar sorologias para hepatites A, B e C.
    • Urina 1.
    • Radiografia de tórax.
    • Outros exames são realizados conforme dados de história e exame físico.
  • Os pacientes com FOI são divididos em quatro subclasses distintas:
    • FOI clássica.
    • FOI nosocomial ou associada à assistência à saúde.
    • FOI neutropênica.
    • FOI associada ao HIV.
    • FOI associada a viagens.
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Etiologias

  • As principais causas são: infecções (15% a 60%), neoplasias (2% a 25%), doenças do tecido conectivo (25%).
  • Quanto maior a duração da febre, menos provável é que um diagnóstico definitivo seja feito, aumentando a probabilidade de doenças indolentes, como as doenças granulomatosas.
  • Entre as infecções responsáveis pela febre de origem indeterminada (FOI) clássica, os abscessos, a endocardite, a tuberculose e as infecções complicadas do trato urinário são as mais comuns.
  • Entre as doenças do tecido conjuntivo responsáveis pela FOI clássica temos a doença de Still (artrite reumatoide juvenil), outras variantes da artrite reumatoide, lúpus eritematoso sistêmico e arterites temporais e polimialgias reumáticas (mais comuns em pacientes idosos).
  • As neoplasias malignas representam de 2% a 25% dos casos de FOI. Entre as neoplasias malignas, os cânceres hematológicos, os hipernefromas e os carcinomas gastrointestinais (principalmente os cânceres colorretais) e do sistema nervoso central são as causas mais comuns.
  • Em crianças, as infecções respiratórias são as causas mais habituais. A doença de Still é uma das principais causas de FOI em crianças mais velhas e adultos jovens.
  • Em pacientes idosos nos quais as infecções são identificadas como a causa da FOI, predominaram os abscessos intra-abdominais, as infecções complicadas do trato urinário, a tuberculose e a endocardite.

Febre de origem indeterminada associada à assistência à saúde

  • A febre de origem indeterminada (FOI) nosocomial ou associada à assistência à saúde tem causas que incluem febre medicamentosa, complicações pós-operatórias como abscessos ocultos, tromboflebite séptica, embolia pulmonar recorrente, infarto do miocárdio, câncer, transfusão sanguínea e colite por Clostridium difficile.
  • A febre é comum em unidades de terapia intensiva (UTI), na maioria das vezes relacionada a origem não infecciosa e com um prognóstico favorável.
  • A febre nosocomial está associada a pior prognóstico. A sinusite associada à assistência à saúde ocorre como complicação da ventilação mecânica e do uso de tubos endotraqueais, gástricos e de alimentação.
  • As causas de febre na UTI não são diferentes das causas gerais de febres associadas à assistência médica, mas raramente causas raras de febres, como rickettsioses, são a causa da FOI nesses pacientes.

Febre de origem indeterminada em imunodeprimidos

  • Diferentes formas de imunossupressão podem ocorrer nesses pacientes. A neutropenia febril após quimioterapia ou associada a aplasia da medula óssea apresentam risco aumentado.
  • Episódios de febre são comuns em pacientes com neutropenia. Os antibióticos empíricos de amplo espectro devem ser administrados imediatamente, sem esperar pelos resultados das culturas, quando a febre se desenvolve em pacientes neutropênicos.
  • Caso não haja resposta à terapia antibacteriana, deve-se considerar a possibilidade de infecção fúngica. Felizmente a febre costuma desaparecer com a melhora da neutropenia.
  • Pacientes com tumores hematológicos em quimioterapia quase invariavelmente apresentam episódios febris.
  • Em pacientes recipientes de transplante de células hematopoiéticas no período pós-enxerto precoce, podem ocorrer, como resultado de reação ao enxerto, infecção fúngica, reativação de herpes vírus, citomegalovírus, vírus Epstein-Barr e herpes-vírus 6. No período pós-enxerto tardio, as causas de febre de origem indeterminada (FOI) incluem doença enxerto-hospedeiro, infecções fúngicas oportunistas, doença linfoproliferativa pós-transplante e recidiva de neoplasias.
  • Pacientes submetidos a transplante de órgãos sólidos podem apresentar febre sem foco determinado. O citomegalovírus é comum, embora sua incidência esteja em queda com a melhora da profilaxia. Outras causas virais incluem o vírus Epstein-Barr, adenovírus, herpes-vírus 6, parvovírus B19 ou herpes-vírus 8.
  • Episódios de febre são comuns em pacientes infectados pelo HIV, o que usualmente significa uma doença sobreposta que são dependentes do grau de imunossupressão, em particular ao número de linfócitos CD4. Cerca de 80% dos casos são causados por infecções, 8% por malignidades e 9% ficam sem diagnóstico definitivo. As séries de casos mostram que micobacterioses, infecção por citomegalovírus, leishmaniose e linfomas são a causa mais comum de FOI nesses indivíduos. Outras causas incluem infecções pelo herpes-vírus 8, histoplasmose e criptococose.

Febre de origem indeterminada em viajantes

  • Devemos considerar diagnósticos comuns no local da viagem. Assim, malária, leptospirose e outros diagnósticos devem ser considerados, dependendo do local da viagem.
  • Pacientes com febre e diarreia frequentemente têm infecções por espécies de E. coli diferentes do país de origem.
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Diagnóstico

  • A história e o exame físico são fundamentais, pois fornecem dicas para o diagnóstico.
  • Os padrões da febre podem sugerir o diagnóstico. A febre com o padrão Pel-Ebstein é observada em alguns casos de doença de Hodgkin, em alguns casos de tuberculose disseminada. Dissociação entre a temperatura e o pulso às vezes é observada na febre tifoide.
  • A resolução da febre após a instituição de uma terapia específica pode fornecer evidências para apoiar um diagnóstico presuntivo.
  • O exame físico pode encontrar achados sugestivos de etiologia no exame físico, como uma artéria temporal nodular ou pulsátil na arterite temporal, as úlceras orais na histoplasmose disseminada ou síndrome de Behçet.
  • Quando linfonodos aumentados são detectados, recomenda-se realizar biópsia do linfonodo.
  • Exames diagnósticos mínimos incluem:
    • VHS e/ou PCR.
    • PPD ou interferon-gama.
    • Sorologia para HIV.
    • Hemoculturas de três diferentes sítios.
    • Fator reumatoide.
    • Sorologia para mononucleose em crianças e adultos jovens.
    • Eletroforese de proteínas.
    • Tomografia de abdome e tórax.
  • O exame da medula óssea deve ser considerado para o diagnóstico de doenças granulomatosas suspeitas, carcinomatose e síndrome hemofagocítica, especialmente em pacientes com contagem anormal de hemácias.
  • Em pacientes transplantados, os níveis de procalcitonina podem ser úteis na diferenciação da infecção da rejeição aguda de órgãos, aumentando em casos de infecção.
  • Estudos de imagem são usados para localizar anormalidades. A tomografia do abdome nesses casos pode ser indicada.
  • Angiotomografias pulmonares podem ser muito úteis no diagnóstico de embolia pulmonar. A ressonância magnética é especialmente útil para avaliação do sistema nervoso central, abdome, do baço e linfonodos.
  • A cintilografia com leucócitos autólogos marcados tem sido empregada para avaliar casos em que infecções e neoplasias malignas são a causa da febre de origem indeterminada (FOI). Atualmente, é pouco utilizada. Outra opção é a tomografia por emissão de pósitrons (PET) usando 18-fluorodeoxiglucose (FDG). O FDG-PET/CT deve ser considerado quando os métodos diagnósticos convencionais não tiveram sucesso no diagnóstico de uma etiologia para FOI.
  • O exame histopatológico de tecidos obtidos por biópsia pode fornecer um diagnóstico definitivo em alguns casos.
  • Biópsia hepática cega, mesmo em pacientes com anormalidades hepáticas conhecidas detectadas por exames laboratoriais ou de imagem, é pouco empregada atualmente.
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Tratamento

  • Testes terapêuticos empíricos devem ser reservados para pacientes nos quais outras abordagens tenham falhado.
  • Um princípio fundamental no manejo da febre de origem indeterminada clássica é que a terapia deve ser suspensa, sempre que possível, até que a causa da febre tenha sido determinada.
  • O tratamento empírico com corticosteroides pode ser apropriado em pacientes com suspeita de arterite temporal para prevenir complicações vasculares, como cegueira ou acidente vascular cerebral.
  • Pacientes com neutropenia febril por quimioterapia ou aplasia de medula óssea apresentam alto risco de evolução ruim e devem receber terapia antibiótica empírica.
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Prognóstico

  • O prognóstico da febre de origem indeterminada (FOI) é determinado pela causa da febre e pela natureza de qualquer doença ou doença subjacente.
  • Pacientes idosos e aqueles com neoplasias malignas têm o pior prognóstico.
  • Pacientes nos quais a FOI permanece não diagnosticada após investigação em geral apresentam um desfecho favorável. A maioria dos casos se resolve espontaneamente.
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Referências

  1. Cunha BA, Lortholary O, Cunha CB. Fever of unknown origin: a clinical approach. Am J Med. 2015;128(10):1138.e1-1138.e15.
  2. Haidar G, Singh N. Fever of unknow origin. New Eng J Med. 2022;386(5):463-77.
  3. Petersdorf RG, Beeson PB. Fever of unexplained origin: report on 100 cases. Medicine (Baltimore). 1961;40:1-30.
  4. Wright WF, et al. Fever of unknow origin. In: Bennett JE, Dolin R, Blaser MJ, editor. Mandell, Douglas, and Bennetts Principles and Practice of Infectious Diseases. Elsevier; 2015.
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