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Baixa estatura em crianças e adolescentes

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Medicina de Família e Comunidade
Baixa estatura em crianças e adolescentes

A baixa estatura é definida como altura abaixo de -2 desvios-padrão para idade e sexo, correspondendo ao percentil 2,3. A maioria dos casos é composta por variantes normais de crescimento, como baixa estatura familiar e atraso constitucional do crescimento e puberdade. Entretanto, uma parcela dos pacientes apresenta causas patológicas que exigem investigação estruturada. O documento-base reforça que monitorar crescimento seriado é tão essencial quanto aferir sinais vitais. 

 

Passo 1: Confirmar se a criança é realmente baixa

O primeiro passo é medir corretamente. Para menores de 2 anos, utiliza-se comprimento recumbente; para maiores de 2 anos, estadiômetro vertical. Erros de técnica e plotagem são causas comuns de falsa suspeita.
Baixa estatura é altura ≤ -2 DP. Altura < -2,25 DP (≤ percentil 1) configura estatura extremamente baixa e exige avaliação especializada. 

 

Passo 2: Avaliar velocidade de crescimento

A velocidade de crescimento deve ser calculada em cm/ano, usando intervalos de no mínimo 6 meses entre medidas. Os valores que sugerem falha de crescimento:
• 2 a 4 anos: <5,5 cm/ano
• 4 a 6 anos: <5 cm/ano
• Após 6 anos: <4 cm/ano (meninos) e <4,5 cm/ano (meninas)
Crianças com baixa estatura e velocidade normal geralmente têm variantes benignas; velocidade reduzida aumenta a chance de causas patológicas. 

 

Passo 3: Comparar com o potencial genético (altura-alvo)

Utiliza-se a altura dos pais (midparental height). Valores dentro de ± 8,5 cm da altura-alvo sugerem baixa estatura familiar. Quando há grande discrepância entre alturas parentais, considera-se a hipótese de condições genéticas autossômicas dominantes. 

 

Passo 4: Determinar a idade óssea

A radiografia de mão e punho esquerdos deve ser interpretada por profissional experiente.  Atraso ≥20% sugere atraso constitucional de crescimento ou doença sistêmica; avanço ósseo pode ocorrer em puberdade precoce e hiperplasia adrenal. Idade óssea é fundamental para projetar altura final. 

 

Passo 5: Identificar variantes normais

• Baixa estatura familiar: pais baixos, idade óssea normal, velocidade normal
• Atraso constitucional: pais com puberdade tardia, idade óssea atrasada, velocidade normal-baixa e puberdade tardia
Ambas requerem apenas monitorização e orientação. 

 

Passo 6: Identificar sinais de doença sistêmica

• Doenças gastrointestinais: dor abdominal, diarreia, má absorção (celíaca, Crohn)
Reumatológicas: artrites, febre, perda ponderal
Renais: poliúria, edema, hipertensão
Pulmonares: infecções de repetição, fibrose cística
Uso de glicocorticoides: impacto dose-dependente no crescimento
Neoplasias: sintomas sistêmicos, efeitos diretos ou tardios de quimioterapia/radioterapia
Transtornos nutricionais e psicossociais: perda ponderal ou ganho inadequado

 

Passo 7: Avaliar doenças endócrinas

• Hipotireoidismo (constipação, lentificação, ganho de peso)
• Deficiência de GH (baixa velocidade de crescimento, adiposidade, hipoglicemia neonatal)
• Puberdade precoce (desenvolvimento sexual precoce e avanço ósseo)
• Síndrome de Cushing (obesidade central, estrias arroxeadas, face cheia)
• Pseudohipoparatireoidismo (braquidactilia, resistência hormonal)
Essas doenças são causas menos frequentes, mas com tratamentos específicos. 

 

Passo 8: Procurar dismorfismos e sinais genéticos

• Síndrome de Turner: pescoço alado, tórax escudado, cubitus valgus
• Madelung deformidade: deformidade típica associada a mutações em SHOX
• Desproporção corporal: suspeita de displasias esqueléticas
A tabela 1 detalha condições como Turner, mutações em SHOX, Noonan e displasias esqueléticas (FGFR3, osteogênese imperfeita). 

 

Passo 9: Definir o perfil laboratorial

Exames indicados quando há suspeita clínica ou velocidade reduzida:
• Hemograma, VHS/ PCR
• Eletrólitos, função renal, fosfatase alcalina, albumina
• Sorologias para doença celíaca
• TSH e T4 livre
• IGF-1 e IGFBP-3
• Cariótipo em todas as meninas
• Testes genéticos conforme fenótipo
O arquivo reforça: exames indiscriminados em crianças assintomáticas têm baixíssimo rendimento. 

 

Resumindo

• Monitorar crescimento é a intervenção mais sensível para diagnosticar precocemente doenças crônicas.
• Velocidade de crescimento é o “sinal vital” da infância.
• Idade óssea define prognóstico e orienta conduta.
• Variantes normais são muito mais comuns que causas patológicas.
• Sinais sistêmicos, dismorfias e velocidade reduzida orientam investigação especializada.

Referência
Children and adolescents with short stature: Diagnostic approach. UpToDate, 2025. Reprint oficial fornecido pelo usuário. 

 

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