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O papel transformador do professor da saúde no SUS: entre hooks e Freire

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Soft Skills na medicina
O papel transformador do professor da saúde no SUS: entre hooks e Freire

“Ensinar é um ato de amor”, escreveu Paulo Freire. Bell Hooks ampliou esse pensamento ao dizer que ensinar também é um ato de resistência, um gesto político que se recusa a aceitar o mundo como ele é, e escolhe reinventá-lo a cada sala de aula.

E quando falamos de professores da área da saúde, o ato de ensinar vai além da transmissão de conhecimento técnico: é uma prática cotidiana de cuidado, escuta e presença. É transformar o espaço do ensino em um espaço de vida, onde se aprende não apenas sobre doenças, mas sobre pessoas, histórias e contextos.

No Brasil, formar profissionais da saúde é, inevitavelmente, formar pessoas para o Sistema Único de Saúde (SUS). Não existe ensino em saúde neutro: todo professor, ao ensinar, está ajudando a construir o sistema público de cuidado que atende milhões de brasileiros. Cada aula de semiologia, cada visita domiciliar supervisionada, cada discussão de caso clínico é uma peça desse enorme mosaico que chamamos de SUS.

 

Entre ensinar e cuidar: um mesmo gesto!

Em Ensinando o pensamento crítico, Bell Hooks nos lembra que educar é um ato profundamente relacional. Para ela, o ensino significativo nasce do encontro entre sujeitos que se escutam, que se afetam e que reconhecem a vulnerabilidade como parte da aprendizagem. O professor que ensina a examinar um paciente com delicadeza, que mostra a importância do olhar e da palavra, está também ensinando uma ética, a ética do cuidado.

Na saúde, esse entrelaçamento entre educar e cuidar é inevitável. Não há cuidado sem ensino, nem ensino sem cuidado. O residente que acompanha um preceptor num plantão aprende tanto pela escuta quanto pelo gesto; o aluno que erra, tenta de novo e é acolhido nesse processo aprende o que significa ser médico, enfermeiro, fisioterapeuta, profissional da saúde, não apenas no domínio técnico, mas na dimensão humana.

Esse é o tipo de ensino que Bell Hooks chamaria de engajado: aquele que reconhece o estudante como sujeito ativo, que o convida à reflexão e o desafia a pensar criticamente sobre sua prática. É esse ensino que constrói o profissional capaz de enfrentar os desafios de um sistema de saúde público, complexo e, ao mesmo tempo, essencial para o país.

 

Professores que sustentam o SUS

Muitas vezes, o impacto do professor da saúde não é visível nos números, mas pode ser medido no cotidiano dos serviços públicos. Está no médico que, anos depois, organiza o fluxo de uma unidade básica; na enfermeira que ensina sua equipe a fazer educação em saúde; no fisioterapeuta que adapta recursos para um paciente com poucos meios. Essas histórias não nascem apenas da formação técnica, mas da presença de professores que ensinaram a pensar, a sentir e a cuidar com propósito.

Esses professores são pontes entre a universidade e a realidade do SUS. Eles traduzem diretrizes em prática, transformam teoria em políticas vivas, aproximam o estudante da vida real da população. São eles que, dentro das residências, estágios e disciplinas, mostram que a saúde pública não é um campo secundário, mas o coração pulsante da formação médica e multiprofissional.

 

Ensinar a pensar de forma crítica e amorosa

Ensinar, na saúde, é muito mais do que preparar para provas ou procedimentos. É preparar para o encontro humano.
É ensinar a ouvir uma história, interpretar um silêncio, lidar com a incerteza. É, como diria Hooks, “ensinar a pensar de forma crítica e amorosa sobre o mundo que habitamos”.

Ao reconhecer o ensino como forma de cuidado, abrimos espaço para uma formação mais humana, coletiva e transformadora.
E ao reconhecer o cuidado como forma de ensino, lembramos que cada atendimento, cada conversa com um paciente, cada troca entre profissionais é também um ato pedagógico,  um convite constante a aprender e ensinar sobre o que significa ser humano.

Neste Dia do Professor, a Manole celebra todos os que, dentro e fora das salas de aula, ensinam para transformar o cuidado e cuidam para transformar o ensino. Porque é assim que se constrói um país mais justo, um SUS mais forte e uma saúde mais humana.

Como estamos?

Na Manole, acreditamos profundamente na força desse gesto de ensinar. Há mais de cinco décadas, caminhamos lado a lado com os educadores da saúde – autores, preceptores, tutores, coordenadores, mestres e mentores – que formam gerações de profissionais comprometidos com o cuidado humano e com o SUS.

Nossos livros, cursos e eventos são construídos com essa missão: levar conhecimento de qualidade a quem ensina e a quem cuida. Cada conteúdo publicado é resultado de um trabalho coletivo entre autores, editores e docentes que acreditam no poder transformador da educação. Por isso, quando celebramos o Dia do Professor, celebramos também o impacto que cada educador tem sobre a saúde pública brasileira.

O professor da saúde é aquele que transforma saber em ação, técnica em empatia, e aprendizagem em política pública. É quem garante que o SUS continue sendo uma conquista viva, feita de profissionais que acreditam no valor de cada vida e de professores que acreditam em cada aluno.

 

Referências bibliográficas

1.Hooks B. Ensinando o pensamento crítico: sabedoria prática. São Paulo: Elefante; 2020.
2.Freire P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra; 1996.
3.Brasil. Ministério da Saúde. Sistema Único de Saúde (SUS): princípios e conquistas. Brasília: MS; 2022.
4.Manole. Catálogo de Educação em Saúde. São Paulo: Editora Manole; 2024.

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